Fevereiro do próximo ano marca os cem anos da Semana de Arte Moderna, acontecimento tido como o mais importante da cultura brasileira no século XX.
Na verdade, foram quatro dias de eventos no Teatro Municipal de São Paulo, que, na época, não chegou a ter maior repercussão. Mas foi assumindo importância e provocando uma segunda leva, pouco depois, com nomes emblemáticos como Carlos Drummond de Andrade, na poesia, Candido Portinari, na pintura, e Villa-Lobos, na música. Mas ficou como o marco de uma nova fase na poesia, literatura, artes plásticas e música, rompendo com o clássico, acadêmico, buscando novas imagens e novos conceitos.
Nas artes plásticas, teve como importante militante Di Cavalcanti, o grande pintor, embora a inspiração maior fosse Tarsila do Amaral, que estava na Europa e não compareceu à exposição no saguão do teatro.
Na poesia, revelou-se destaques como Manuel Bandeira e Menotti del Picchia; Plinio Salgado, no romance; na escultura, Hildegardo Leão Veloso, autor das principais estátuas históricas do Rio, como a de D. Pedro I aqui e IV aí, embora no melhor estilo clássico. Outros nomes de relevo foram Cândido Mota Filho, João Scantimburgo e Oswald de Andrade.
Embora de sentido nacionalista, a maioria dos articuladores do movimento vinha da burguesia com formação cultural em Paris do pós-guerra de 18. Chegavam influenciados pelo modernismo europeu. Internamente, o evento foi prestigiado pelo governador paulista Washington Luís, futuro Presidente da República. Não havia esquerda e direita, mas a maioria da primeira fase era de direita, assumindo a esquerda depois da segunda e da terceira. Nas artes plásticas, a grande mudança teve a influência importada de Pablo Picasso, com quem os artistas conviveram em Paris. Era o cubismo chegando aos trópicos.
A segunda fase trouxe Jorge Amado, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Cecília Meireles e Vinicius de Morais. A terceira, pós-45, Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto e Ariano Suassuna. E a pintura brasileira passou a ser a moderna, com Volpi, Mária Martins , Antônio Bandeira, Cícero Dias – residente em Paris – e outros.
A hoje consagrada Semana de 22, outra denominação daquele evento, não foi uma unanimidade no mundo intelectual. Gilberto Freyre, o maior pensador do Brasil, por exemplo, não deu importância ao movimento. Sugeriu que o encontro do Brasil com suas origens e cultura passava pelo tropicalismo e pela miscigenação, patrimônio maior herdado dos portugueses, além da língua. Monteiro Lobato, outro crítico, chegou a chamar o movimento de paranoia e mistificação.
Outra versão para a iniciativa é a de que o movimento foi estimulado pela aristocracia do café, que, queria deslocar a cultura nacional do Rio de Janeiro para São Paulo. Por isso, eram quase todos paulistas, o que, inclusive, estimulou a reação dos nordestinos, especialmente pernambucanos, que, em 1926, tentaram promover evento semelhante com seus valores. Mas, na segunda e terceira fase, houve lugar para cariocas, mineiros e nordestinos no movimento modernista. Na pintura com Celso de Lima e Amílcar de Castro.
Como sinal dos tempos, da ditadura editorial das esquerdas, ano que vem, quando se falar do centenário da Semana, certamente haverá uma certa diminuição do papel e da obra de dois expoentes: Plínio Salgado, consagrado pelo seu livro O Estrangeiro, e o poeta Menotti del Picchia, ambos com futuro político no parlamento brasileiro, pelas direitas.