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Muito se tem escrito sobre António de Oliveira Salazar e seus 40 anos de comando e reconstrução de Portugal. Não apenas portugueses, mas estudiosos ingleses, americanos, franceses e outros somam centenas de livros.
A crise de valores que o mundo ocidental vem vivendo nestas décadas pós-guerra fria valoriza, e muito, as bases do pensamento do homem que influenciou a política em diversas partes do mundo. No Brasil, Getúlio Vargas, em 1937, ao implantar a ditadura, deu à nova Constituição e regime o nome de Estado Novo.
Falta uma edição em português da tese defendida em Buenos Aires pelo professor Marcos Pinho de Escobar, “Perfis Maurrasianos em Oliveira Salazar”. O ilustre pensador é formado na Universidade Católica do Rio de Janeiro, com doutorado na de Buenos Aires e na George Whashington, nos EUA. E residente não habitual em Portugal.
O profundo trabalho tem como referência na sua base de consultas os dois mais importantes estudiosos daqueles anos e seu personagem maior: Jaime Nogueira Pinto, que é quem melhor conhece e interpreta os anos do salazarismo em Portugal, como testemunha pessoal da história contemporânea, e Franco Nogueira, o biógrafo que foi ministro e leal discípulo do inesquecível estadista. Ambos são intelectuais independentes, em cujos trabalhos o ingrediente ideológico não prevalece, o que é comum nos trabalhos de autores não portugueses.
Charles Maurras, fundador da Ação Francesa, movimento católico e conservador que moldou o pensamento das direitas que prevalece até nossos dias, foi no início do século XX o formulador da doutrina presente na ação de líderes relevantes como Franco, Mussolini, Pétain, Miklós Horthy e Plínio Salgado.
Salazar, ainda jovem ativista católico de Coimbra, por cujo partido foi eleito deputado para uma meteórica passagem pelo Parlamento, foi um leitor voraz de Maurras e, ao longo da vida, foi estreitando afinidades, troca de correspondência e muitos amigos em comum. Maurras, antes de morrer, chegou a expressar sua admiração pelo dirigente português.
Franco Nogueira e Jaime Nogueira Pinto vão direto aos pontos que confirmam as afinidades no pensamento de Maurras e Salazar na ênfase à ordem, à importância do autoritarismo democrático, da iniciativa privada e aos princípios do catolicismo. Lembra que as encíclicas de Leão XIII foram muito presentes na orientação de Salazar e suas políticas sociais.
Pinho Escobar encontra nos textos dos dois intelectuais e pensadores pontos em comum, como as simpatias monárquicas e o corporativismo. Vargas, no Brasil, experimentou o corporativismo presente na Constituinte de 1934. Ambos defendem princípios tradicionais do cristianismo, embora o francês não fosse religioso – como a importância da família na preservação dos fundamentos da nacionalidade. Ambos faziam restrições ao capitalismo. Salazar desconfiava dos donos do dinheiro das multinacionais, o que pode ter atrapalhado o processo de industrialização de Portugal.
Uma das preocupações da Europa hoje é a questão da segurança pública. Salazar, nos anos 1930, ao apoiar os serviços de segurança, chegou a afirmar que esperava que “no próximo verão os lisboetas pudessem dormir de janelas abertas como os romanos”, numa alusão ao sucesso de Mussolini na Itália. O autoritarismo maurrasiano de alguma maneira facilitou o sucesso das políticas dos governos de direita na Itália, Espanha e Portugal que proporcionaram ordem e progresso a seu tempo. Todos prestigiaram corporações sindicais sem ceder ao grevismo que, desde então, é a bandeira do sindicalismo selvagem de influência de esquerda marxista, cujo objetivo não é a defesa do trabalhador, mas sim a destruição do capitalismo.
Publicar esse trabalho em português certamente vai ajudar a se compreender os problemas atuais que preocupam a maioria silenciosa dos europeus que cultuam os valores cívicos, da cultura judaico-cristã e se encontrar o que pode ser aproveitado neste momento de guerras, crise econômica e uma pauta que nega valores tradicionais dos povos ocidentais.
O mundo moderno não permite repressão às diferentes opções de comportamento e pensamento, mas não precisa exaltar o que a sociedade, na sua maioria, não abraça. Aceitar e respeitar não significa compactuar.
As direitas, conservadores em geral, precisam ter conteúdo ideológico para sustentar esta luta contra o negacionismo e a divisão dos homens por raças, opções sexuais e religiões. A simples pregação geral não é suficiente. Tem de ter conteúdo.
Publicado em: Jornal Diabo