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Impressiona aos que acompanham a história como o poder prejudica a capacidade de sentimento do momento em que vivem e deixa a falar sozinhos os que percebem que o processo pede uma visão maior do que qualquer ação a curto prazo. E mais: desde sempre a conjuntura mundial pôde influir na vida de cada país de uma forma diferente.
No século passado, foram muitos os momentos em que homens lúcidos, isentos e pragmáticos acertaram, uns com êxito, outros não. Caso mais clássico é o de Winston Churchill, que condenou a visita e o acertado na viagem de Chamberlain a Berlim. Churchill previu que a manifestação de fraqueza e ingenuidade do Reino Unido custaria caro à Europa. Não deu outra.
Na mesma década, na Espanha, o General Francisco Franco, então o mais jovem da Europa, pressentiu que os acontecimentos em Madrid estavam em linha com as aspirações da URSS de tomar conta da Península Ibérica. Partiu para colocar seus companheiros militares diante do fato consumado do levante.
Do seu lado, Mussolini, na Itália, também percebeu que a Espanha, na esfera soviética, teria reflexos no mundo latino, na Europa e nas Américas, por isso apoiou Franco desde o primeiro momento, tendo colocado em solo espanhol, além de armas e aviões, 70 mil italianos, 20 mil dos quais tombaram na guerra civil. Esta percepção efetivamente salvou Espanha, Portugal e a América Latina do domínio comunista. Os reflexos foram os regimes contra esse regime, na Argentina de Peron, no Brasil de Vargas e nos caudilhos da América Central.
No caso português, a habilidade de Salazar foi no sentido de poupar o país da guerra, promovendo uma inteligente neutralidade que o manteve com as portas abertas entre os que se enfrentavam. Mas ambos os lados deveram atenções ao governo português durante o conflito. E convém lembrar que, em termos humanitários, Lisboa foi importante como rota de fuga para centenas de milhares de judeus em partida para os EUA, Canadá, Brasil, Argentina e Paraguai.
A guerra fria evidenciou a queda da qualidade dos homens públicos em todo ocidente. E a hábil manipulação da opinião pública ocidental em ocultar o que se passava no outro lado da Cortina de Ferro e a infiltração até a quase dominação dos meios de comunicação, incluindo o cinema em que Hollywood gerou no pós-guerra uma fortaleza na defesa sutil dos interesses soviéticos. A abertura dos arquivos revelou grande números de cineastas que eram também agentes comunistas.
Foi preciso os anos 1980 com Reagan, Thatcher e João Paulo II para a derrocada da Cortina de Ferro, provocada sobretudo pela falência daqueles países diante do mundo que se abria com a globalização e as privatizações. As estatais eram fonte de recursos para os movimentos de esquerda, que tinham como massa de manobra sindicatos bem-organizados, que geraram uma elite privilegiada de trabalhadores, sempre dispostos a uma greve e a minar o setor privado.
Um pouco antes desse trio histórico, entretanto, Portugal, nos anos 1970, tinha um austero estadista em Marcelo Caetano, homem de invejável cultura e arguto observador do momento histórico que vivíamos. Não se iludia com o comportamento injustificado da alta burguesia, dos mais abastados, que adotaram posições “progressistas” que os levariam ao final do processo à desgraça.
José António Saraiva, em seu recente livro “Estado Novo: A História Como Nunca Foi Contada”, revela conversa de Freitas do Amaral com Marcelo, em que este ouviu do primeiro-ministro que estava desiludido de não ter tido os apoios que precisava para resolver os dois problemas que poderiam levar Portugal à grave crise, que era a questão ultramarina. Ele defendia uma abertura unindo portugueses e angolanos de origem e a abertura do regime abrandando a censura inicialmente. Segundo o registro – pág. 115 –, chegou a se referir aos tempos de Maria Antonieta em que burgueses e respeitáveis senhoras burguesas acolhiam ideias novas que os levariam ao cadafalso. E aduziu que os próprios capitalistas tinham medo de defender o regime que, “bem ou mal, os sustentava”. Marcelo, naquela conversa, previu a força dos comunistas nos meios militares cujas consequências seriam imprevisíveis. Para ele, supõe-se que o 25 de Abril não foi de todo uma surpresa.
A este precioso depoimento histórico, junta-se a revelação de Marcelo Caetano, em 1975, em minha casa no Rio de Janeiro, de que, quando da renovação da presença americana nos Açores, em carta ao presidente dos EUA, afirmou que Portugal renovaria o acordo, independentemente das compensações, para ser coerente com sua identidade com o ocidente e que já vinha lutando em África contra a expansão soviética, que aspirava os territórios portugueses.
Hoje, a história se repete no ocidente especialmente. O capitalismo voltado para lucros e a Nova Ordem, comunismo de roupa nova, vão ganhando terreno, com a média, meios culturais e minorias raciais mobilizadas para a destruição do que resta da civilização ocidental, cristã e democrática. Os que têm consciência da realidade devem alertar os ingênuos de plantão, que dão uma capa inofensiva ao ardil das forças do mal.
Publicado em : jornal Diabo 21/07/22