Parece ironia, mas, nesses tempos de tanto radicalismo – e negacionismo – e que não tem lugar para avaliações isentas de sentimentos menores, a preocupação com o Rio, meu berço e dos meus, me reporte a um homem público de quem discordei, mas soube admirar como intelectual e reconhecer que foi um bom gestor de nossa cidade. Carlos Lacerda, um dos dois governadores da Guanabara com relevantes serviços prestados. O outro, Negrão de Lima, teve um acervo maior de realizações, pois, não tendo a dimensão intelectual de seu adversário, era político hábil, conciliador e se deu bem com os três presidentes militares que o Brasil teve ao longo de seu mandato . Claro que pôde fazer muito mais.
Mas Carlos Lacerda tinha dimensão, soube inovar, tocou obras relevantes, como Guandu e fez boa parte do Aterro, iniciado pelo Negrão prefeito e terminado pelo Negrão governador, sucedendo a ele.
Coube ao destino, no entanto, encontrar Lacerda no quarto centenário da cidade, para que fosse montado um programa extraordinário de comemorações, atraindo as atenções do Brasil e até com reflexos internacionais. Teve o apoio da classe empresarial, a que devemos lembrar o grande Abraão Medina, dono do Rei da Voz, a maior loja de eletrodomésticos do Rio, patrocinador dos grandes programas de televisão, como os de Flávio Cavalcanti e que nos legou dois filhos notáveis no amor à cidade, Rubem e Roberto Medina.
Lacerda lembrou que o Rio tinha um povo com alegria, esperança, ecumênico, “abraçado com o futuro”, e que somos aqui a síntese do Brasil, sua porta. E teve a seu lado políticos locais de dimensão nacional, como o mineiro de Ubá Ary Barroso e Paschoal Carlos Magno, vereadores no Rio, a corretíssima deputada Lígia Lessa Bastos. Na equipe, jovens idealistas e sensatos como José Zobaran, Célio Borja, Nina Ribeiro, Mauro Magalhães, além dos já tarimbados Adauto Lúcio Cardoso, Flexa Ribeiro, Marcelo Garcia, Raimundo de Brito. Na oposição, havia políticos igualmente respeitados, como Augusto do Amaral Peixoto, Levi Neves, Rubens Berardo, Silbert Sobrinho e outros. Bons tempos a serem recuperados.
Convém lembrar que tanto Lacerda como Negrão, embora políticos, não se confraternizavam com gente menor e não se distanciavam do pensamento de seus eleitores.
Publicado em : Jornal Correio da Manhã 24 06 21