Tomei o título da biografia de Antônio Olinto, do escritor cearense José Luís Lira, de uma bonita e sensível militância nas letras e no exercício pleno da fé cristã. O livro é oportuno uma vez que os temas africanos voltaram a aparecer em publicações, mas, agora, infelizmente, com um viés ressentido, culpando os europeus pela compra de escravos vendidos e transportados por outros africanos. Africanistas de verdade não compartilham desta linha, muito pelo contrário. O passado é o passado.
Embora através dos séculos a colonização europeia em África não tenha dado progresso e prosperidade desejáveis, a situação que começava a melhorar foi interrompida pela “descolonização”, que abriu as portas para a violência e para a corrupção. Na verdade, não restou nem um país com avanços na qualidade de vida de suas populações e viram surgir o descontrole demográfico, a corrupção e a violência. Apesar de riquezas exploradas, a começar pelo petróleo. Na África do Sul, parece inquestionável o retrocesso, com o racismo tendo trocado de lado. Os números da SIDA ainda impressionam, assim como as mortes ocasionadas por disputas tribais frequentes.
Na Academia Brasileira de Letras, temos um africanista com robusta obra no embaixador Alberto Costa e Silva, que esteve na Nigéria e foi embaixador em Portugal. Antes, Antônio Olinto, que foi adido cultural na Nigéria e no Reino Unido. Na Nigéria, estreitou os laços culturais com o Brasil e formou a maior coleção de máscaras africanas do Brasil.
O livro A Casa d’Água, de Olinto, é obra monumental, que narra a ida de uma família de volta após a Abolição da Escravatura, pela Princesa Isabel, então Regente do Brasil. Descreve sua saga e finaliza com a eleição do neto da matriarca para a presidência do país de colonização francesa surgido no pós-guerra. Este livro está traduzido em mais de 20 países em oito idiomas diferentes. No Brasil, está na décima edição. O Rei de Keto e o Trono de Vidro completam sua trilogia africana.
Sua atividade em Lagos foi preciosa para a divulgação do nosso idioma por lá. Como eram muitas os descendentes de brasileiros retornados no final do século XIX, foi criada A Associação dos Descendentes de Brasileiros, reforçada por Antônio Olinto em 1963. A escritora Zora Seljan, mulher de Antônio Olinto, foi sua parceira nesta paixão africana, a que se dedicaram por quase meio século de suas vidas em comum.
Já Alberto Costa e Silva, com mais de dez livros publicados sobre a África, diz que “para entender o Brasil, é preciso entender a África”, e na sua vasta obra analisa aspectos da presença africana na formação do povo brasileiro. No Segundo Império, dada a forte presença negra na população, o grande fluxo da imigração europeia teria tido o objetivo de “embranquecer o Brasil”, inclusive pela retomada da imigração portuguesa no início do século XX.
Nota-se no Brasil uma presença africana mais forte do que em outras nações que receberam essa mão de obra nas Américas, nos costumes, na música, na gastronomia, no folclore e na religião, desde que, na Bahia, o catolicismo se mistura com os ritos africanos, em geral. A Bahia guarda esta presença de maneira muito marcante, na sua população, em todas as classes sociais e culturais, o que não ocorre nesta intensidade no resto do Brasil e
na culinária fortemente influenciada pela africana. E no clima, sendo o seu inverno muito semelhante ao cacimbo angolano.
Manuel Vinhas, um dos portugueses que mais fez pelo desenvolvimento de Angola, entusiasta da província, quando exilado no Brasil em função do 25 de abril, radicou-se em Salvador, em casa que fora ocupada por Vinicius de Morais, “por se sentir um pouco em África ali”, segundo suas palavras.
A presença africana no mundo lusófono é inquestionável. Mas nunca condenável, pois se houveram erros, todos os envolvidos estariam implicados.