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A história e as suas personagens, no passado, tinham uma ligação maior do que hoje com povos e culturas consolidadas e não raramente presentes em mais de um país. Um exemplo foi a vida deste almirante que se tornou relevante na América do Sul, na Grécia e, de certa maneira, em Portugal, conhecido por Lord Cochrane.
Chamado de “Lobo do Mar”, foi um oficial naval e político britânico que desempenhou um papel importante nas histórias militares e políticas do Reino Unido, Chile, Brasil e Grécia. Filho de um aristocrata escocês, Conde de Dundonald, cujo título veio a herdar, entrou na Marinha Real Britânica ainda jovem e destacou-se rapidamente como um bom navegador e estratega. Homem de grande personalidade, foi um político controverso e acabou afastado da vida pública inglesa. Pouco antes de morrer, já de volta ao Reino Unido, foi reintegrado na Marinha Real.
Aproveitando seus conhecimentos na área naval e precisando ganhar dinheiro, Cochrane foi ajudar na independência do Chile e do Peru da Coroa Espanhola e depois, chamado ao serviço do imperador D. Pedro I do Brasil, em 1823, comandou a Armada Imperial Brasileira na Guerra da Independência do Brasil, responsável pela rendição do General Madeira, que resistia na Bahia, em 1825, e a repressão ao movimento separatista em Pernambuco, em 1824, e no Maranhão, em 1923. Foram anos de intensa actividade. Todas estas acções na América do Sul foram muito bem-remuneradas, é bom lembrar.
Cochrane deixou o Brasil como comandante-em-chefe da Esquadra Brasileira após o tratado de amizade entre Brasil e Portugal, em 1825, como o primeiro almirante brasileiro. A família Cochrane no Brasil, uma das mais tradicionais de São Paulo, Ceará e Minas, descende de um primo seu que se casou com uma mineira e radicou-se no Ceará, ligado à família Alencar, do escritor do século XIX, e do militar presidente Castelo Branco, de diplomatas e empresários no século XX. A casa do médico Thomas Cochrane, no Rio, no Alto da Boavista, possui preciosos azulejos portugueses.
Ficou muito controverso na história do Maranhão, acusado de ter saqueado a cidade de São Luís após a rendição das autoridades portuguesas, em 1823, tomando posse de um património estimado em 100.000 libras esterlinas, uma fortuna para a época, inclusive bens de habitantes da cidade. Apesar de seu comportamento em São Luís, Cochrane foi recebido no Rio de Janeiro como herói nacional e agraciado por D. Pedro com a recém-criada Ordem do Cruzeiro do Sul e o título de Marquês do Maranhão – o que soa aos maranhenses como uma decisão infeliz até hoje. Pois, se de um lado, defendeu a Independência do Brasil, por outro, foi duro com a população, preponderantemente portuguesa. Antes, em Inglaterra, esteve envolvido em acusações de golpes financeiros.
Foi esta fama de herói conferida ao almirante escocês que levou José Sarney, no cargo de presidente da República, a visitar a Abadia de Westminister, em Londres. Ao aproximar-se da tumba, onde se encontravam os restos mortais de Cochrane, Sarney pisou a lápide e exclamou baixo, para surpresa dos que o acompanhavam: “Corsário!”. Aliás, a tumba naquela Catedral mostra bem a sua importância
Publicado em: Jornal O Diabo Portugal – 06/02/2022