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A Argentina seria o país ideal. Tem uma das melhores agriculturas do mundo, incluindo o melhor gado, é autossuficiente em petróleo, tem ainda bons índices de educação, uma etnia harmoniosa, bom clima e uma presença cultural forte, sendo de se destacar seu cinema, que é de alta qualidade. Buenos Aires já foi a capital da cultura na América Latina, recebendo tradicionalmente o que havia de melhor na Europa e na América do Norte.
Não tendo se envolvido nas duas guerras mundiais, foi, entretanto, grande fornecedora de alimentos para os conflitantes. Recebeu uma positiva imigração de italianos, poloneses, alemães e judeus. Buenos Aires possui seu metropolitano desde 1928, meio século antes do Rio e de São Paulo.
Apesar disso tudo, nunca foi feliz com seus governantes. Desde o século XIX, com o ditador Rosas, que se incompatibilizou com o Brasil e o Uruguai. No século passado, e até hoje, a presença do General Juan Domingo Peron, dividido em muitas facções, domina a cena local, com bolsões de demagogia e corrupção. Os argentinos foram caindo em todos os sentidos, sobrevivendo a crises justamente por ter bases sólidas na economia, mas passou a ter uma camada de menor renda, a metade da que tinha nas décadas passadas. E praticamente sucateou sua indústria.
Seu regime militar – ao contrário do brasileiro e chileno, que apresentaram números altamente positivos em termos econômicos e de crescimento dos dois países – manteve a ordem, mas enfrentou uma guerra interna violenta e não compensou com desenvolvimento. De lá para cá, foi uma crise atrás da outra, com troca de presidentes e fracassos nos poucos momentos de moderação, como no mandato de Raúl Alfonsín, que teve de passar a presidência antes da data pela dimensão da crise na economia.
A eleição de Mauricio Macri foi um vento de esperança, pois o eleito vinha da área empresarial e promoveu a remoção de empecilhos legais ao investimento, incluindo a legislação laboral. Mas sempre sob forte oposição dos sindicatos e do peronismo da ex-presidente Cristina Kirchner, envolvida em muitos casos de corrupção, processo iniciado pelo seu marido, Nestor Kirchner.
Agora a reeleição corre perigo, o que já custou uma subida do dólar, a moeda de referência dos argentinos desde sempre, das taxas de juros e um pânico no meio empresarial. Cristina é vice de um peronista moderado, mas certamente o mandato vai ser mais próximo de Cuba e da Venezuela, desestabilizando o país.A queda da bolsa fez com que todos os papeis negociados valessem menos do que as ações do Banco Santander, por exemplo.
Os argentinos sempre pouparam fora do país, sendo a mais importante clientela dos bancos internacionais, na América Latina. E Macri conseguiu acabar com o calote nos mercados internacionais do mandato de Nestor e negociar com o FMI. A elite mais tradicional já não é tão influente, uma vez que muitas famílias vêm deixando o país nos últimos 30 anos. O último reduto é o jornal El Clarín, um importante grupo de mídia e de oposição ao peronismo.
A reação dos mercados ao favoritismo peronista pode assustar a classe média, poderosa e ainda numerosa, e tornar viável a reeleição na segunda volta, que será em novembro. Fora disso, a Argentina vai entrar num beco sem saída.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, disse que um resultado bolivariano pode provocar uma grande leva de argentinos em direção ao Brasil, em fuga do caos. Apesar de muito dependentes um do outro, Argentina e Brasil, com a volta peronista, certamente terão relações menos estreitas, com perdas para ambos.O argentino peronista já despejou insultos ao brasileiro.
Para se avaliar a ligação dos dois países, são quase 30 voos diários, ligando cidades brasileiras a argentinas. E 80% dos turistas nos estados sulistas são argentinos e um terço dos que viajam ao Rio de Janeiro.