A pretexto de combater o terrorismo e a corrupção, a nova esquerda aproveitou os eventos do 11 de setembro nos EUA para promover a maior ofensiva contra o capitalismo, a liberdade do cidadão, e incentivar o poder policial do estado à pessoa bem-sucedida. Ter dinheiro e gastá-lo passou a ser olhado com suspeição, e os controles vigentes em todo o mundo estão entre o absurdo e o ridículo.
As operações bancárias superiores a cinco mil euros ou dois mil, no Brasil, exigem explicações para justificar o saque em dinheiro, num primeiro passo para acabar com o papel moeda e colocar tudo sob controle eletrônico das finanças. O cidadão trabalha, investe, paga impostos e tem de dar explicações ao uso que deseja dar a seu dinheiro. O volume do terrorismo não circula nos bancos, e a corrupção e sonegação certamente não envolve mais do que 1% da população, por suposto.
O controle poderia se limitar aos bens de grande valor da preferência de criminosos e novos ricos, como automóveis acima de 200 mil euros, embarcações, aeronaves e residências acima de dez milhões de euros. Verificada a situação fiscal dos detentores destes bens, seria natural uma chamada para esclarecimentos quando não compatíveis e não a priori considerar todos marginais.
Nos aeroportos, é anunciada a necessidade de declaração de valores em espécie superiores a dez mil euros, como se um hotel cinco estrelas não custasse mais de mil euros por dia e boas refeições, mais de 200 por pessoa, nas principais capitais do mundo. São exemplos o Ritz, em Paris ou de Lisboa, e o Copacabana Palace, no Rio de Janeiro. Obrigar o uso de cartões é uma interferência na autodeterminação do cidadão. Este, não estando na lista da Interpol, das finanças do país em que está ingressando, não deveria ter de dar satisfações sobre o uso que faz de seu dinheiro ganho com trabalho ou herdado.
Empresários teoricamente com algum poder político pela sua grandeza e presença mundial, como Bernard Arnault, Maria Fernanda Amorim e Carlos Slim, não reagem ao rigor da lei que os obriga a constranger clientes de simples aquisições de cinco mil euros, naturais para compra de joias e acessórios de alto luxo, ou mesmo bons vinhos. E os bancos questionam transações de maior volume, sem consultar as informações constantes em seus arquivos sobre a capacidade financeira do cliente. No final, 90% paga pelos sonegadores, corruptos ou traficantes. Estes parecem impunes pelo luxo que ostentam, sempre usando de métodos pouco convencionais.
Importante empresário brasileiro conta que em Nova York foi comprar um jogo de carteiras de couro em famosa grife, no valor de seis mil e poucos dólares, e pediram o passaporte para tirar cópia, passagem de avião, hotel em que estava hospedado, levando-o a desistir da compra indignado. Outro, em São Paulo, se viu embaraçado diante do pedido de justificativa de um depósito em conta de uma amiga de mocidade em dificuldades. Mostrou sua robusta renda, volume de impostos pagos às Finanças e, mesmo assim, queriam explicações. Versão capitalista do estalinismo.
Seria legítimo e oportuno que se avaliasse estes procedimentos limitadores da liberdade individual, pelo menos nos valores envolvidos nestes draconianos controles, que mais irritam do que prejudicam.
Já seria também tempo da liberação de perfumes e líquidos nas bagagens de mão nos aeroportos e se exigir, apenas por vezes, a retirada de cintos e sapatos na inspeção de segurança.
Os bem-sucedidos não podem ser tratados como se fossem marginais. Afinal, quem trabalha, produz e investe é que gera empregos, paga tributos e faz circular a riqueza. O consumo do luxo tem sentido social. Os ricos pagam bem a seus empregados, frequentam lugares caros, usam classe executiva dos aviões e ocupam a hotelaria de luxo.
Querem acabar com o capitalismo ou com os capitalistas? Quando vai se procurar dar um basta neste quadro inadmissível para a autodeterminação do cidadão?
Publicado em :jornal Diabo.pt 07/12/24