A mais pragmática criação a nível político da preservação da língua portuguesa, sua cultura e integração dos povos de língua e história em comum foi a CPLP. A coincidência de dois presidentes sensíveis, como Mário Soares e Itamar Franco, sendo este tendo a seu lado o grande militante da cultura e da luso-brasilidade, José Aparecido de Oliveira, que, com Negrão de Lima, forma entre os mais relevantes embaixadores do Brasil em Lisboa.
Mas algumas medidas de caráter prático, sem custos, ainda dificultam a circulação da língua, a começar pelos livros. Uma imposição atribuída à legislação da Comunidade Europeia faz com que livros postados no Brasil para Portugal, pelos Correios ou mesmo empresas como DHL, fiquem retidos nas alfândegas para pagamento de irrisório imposto. A grande maioria dos livros é assim abandonada, pois a ida para pagar e retirar livros demanda tempo. E paciência. Para acabar com isso, basta apenas uma medida simples que depende apenas da vontade política.
Sem uma política que facilite a circulação dos livros, ocorre a queda nas reedições dos autores com público nos dois lados do Atlântico. E as grandes referências são autores dos dois últimos séculos.
Curiosamente, a oferta de boas obras e revelação de bons autores foram por espasmos e concentrados no tempo. Como se fosse safra de intelectuais. Na primeira metade do século XIX, Almeida Garret não veio só, mas acompanhado de Alexandre Herculano e Camilo Castelo Branco. Este ainda adentrou a segunda metade e virada do XIX para o XX, com os fantásticos Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Antero de Quental, Guerra Junqueiro.
Já no Brasil, a grande safra foi na virada do século com Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Graça Aranha, Olavo Bilac, até 1922, que revelou, na Semana da Arte Moderna, Plínio Salgado, Menotti Del Picchia; na pintura, Di Cavalcanti e Tarsila do Amaral; na música, Heitor Villa-Lobos.
O acordo ortográfico facilita mais ainda a livre circulação de livros, não só por editoras como por pessoas, na troca saudável de obras.
Hoje, a integração está mais por conta da música popular brasileira, muito presente em Portugal e Angola, e das novelas. Mas livros ainda pedem atenção. Bons tempos em que se comprava em Lisboa os jornais O Globo e O Estado de S. Paulo no mesmo dia da publicação.
No mundo editorial, já são muitas as editoras presentes nos dois países e até livrarias, como a Travessa, no Principe Real, que é referência na oferta de literatura brasileira.
As ligações da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Ciências de Lisboa já são importantes e prestigiadas. Mas temos de avançar, pelo menos na busca de um intercâmbio como nos anos 50 e 60, quando Gilberto Freyre lançou com sucesso o luso-tropicalismo e escreveu memorável livro de sua viagem aos estados ultramarinos.
Neste mundo, cada vez mais digital, prestigiar o livro impresso é preservar a língua, manter o interesse pela leitura.
A CPLP pode ajudar.
Publicado em: Jornal O Diabo.pt 27/02/24