Uma das famílias com presença relevante na história do Brasil é a Figueiredo, que no século passado se fez presente na pessoa da General Euclides Figueiredo, que participou de diversos movimentos militares e políticos. Foi deputado pelo Rio de Janeiro na Constituinte de 1946, tendo deixado a política ao não se eleger senador na legislatura seguinte. Combateu na Revolução Constitucionalista de São Paulo e, vencido, exilou-se em Lisboa. Mais adiante, voltou a se refugiar com a família em Portugal, só retornando quando da queda de Getulio Vargas. Na primeira vez, estava com os filhos, três futuros militares e mais o escritor, jornalista, teatrólogo e tradutor Guilherme Figueiredo, um dos grandes nomes da literatura brasileira do século XX. A vida movimentada de Euclides Figueiredo se deveu às suas convicções liberais, exercida com coragem e independência.
Os filhos militares chegaram ao posto de general de Exército, Euclides Filho, Diogo e o mais jovem, João Batista, que foi presidente da República, responsável pela abertura política e anistia pós-regime cívico-militar de 1964. Hoje, um neto, o jornalista Paulo Figueiredo, que vive nos EUA, foi indiciado no processo sobre tentativa de golpe em 2022, quando já não vinha ao Brasil há mais de dois anos.
Mas talvez a maior figura da família tenha sido Guilherme Figueiredo, com notável obra literária, autor da peça brasileira mais representada no exterior, “A raposa e as Uvas”, fundador de uma universidade, a Unirio, adido cultural em Paris, publicitário e assessor de importantes empresas brasileiras.
Este gigante do jornalismo, com passagem marcante nos principiais jornais brasileiros, herdeiro da coerência e dignidade herdadas do pai, teve inédita atitude ao abandonar o jornalismo depois de 46 anos de exercício da profissão, com a posse do irmão na Presidência da República. Ao anunciar a decisão, escreveu que, tendo um irmão no mais alto cargo da República, seria um mau jornalista ou um mau irmão.
Este homem de temperamento forte, “sem papas na língua”, aos 40 anos conheceu o sucesso internacional com sua peça teatral, que veio a se juntar à obra bem recebida pela crítica. Resolveu disputar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, em vaga prometida a um ilustre médico, Deolindo Couto, homem ligado ao então presidente da República, Juscelino Kubitscheck. Não ouviu as ponderações de que, sendo muito jovem, poderia esperar outra vaga. Ao ser derrotado, escreveu um livro em que narrava as 38 visitas que fez a acadêmicos, afirmando que percebeu que eles estavam mais interessados em ter um redator de receitas médicas na academia do que um jornalista teatrólogo e escritor. Depois, declarou que não passava pela sua cabeça disputar uma cadeira na Academia Nacional de Medicina. Nunca mais disputou.
O respeito, e até mesmo a aceitação eleitoral de militares no Brasil, como no mundo ocidental, se deve a esta formação rígida em princípios éticos e morais. O presidente Emílio Médici, general, adiou o aumento da carne por três semanas. Ao liberar o então ministro Delfim Netto, explicou que precisou de tempo para vender 20 vacas que possuía para não se beneficiar do aumento da carne. O poderoso ex-ministro gostava de dar este exemplo da austeridade dos presidentes militares, dos quais foi o czar da economia em três deles. E o presidente Costa e Silva recomendou ao filho, coronel, que pedisse reforma, pois, durante o seu mandato, não o promoveria.
Que diferença!!!
Publicado em: site jornal Diabo.pt 11/01/25