A tragédia do incêndio no Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro, não foi um caso isolado, mas fruto de uma situação caótica no orçamento do Estado brasileiro, com cortes frequentes, o envolvimento político e ideológico na gestão. O reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), responsável pelo museu desde 1946, é um militante político de esquerda, fundador do partido mais a esquerda com representação no Parlamento, apoiador público do Movimento dos Sem Terra (MST), entidade responsável por invasões de propriedades, destruição de bens ligados ao agronegócio, inclusive de pesquisa. Toda a equipe do reitor Roberto Leher é composta por representantes deste mesmo partido.
A universidade tem um orçamento próprio e cabe a ela distribuir os recursos liberados pelo governo. O museu nunca foi uma prioridade. A Biblioteca Nacional, majestoso edifício no coração da cidade, tem tido outro tipo de tratamento, recebendo recursos do governo, de projetos incentivados e tem seu prédio e equipamentos constantemente sendo tratados. A biblioteca é das mais importantes do mundo, pois era a de Lisboa, que ficou no Rio, depois da partida de D. João VI de volta a Portugal.
O Museu Histórico, criado pelo Rei D. João VI, em 1818, estava no grande imóvel que foi a sua residência e, depois, do filho Pedro I do Brasil e IV de Portugal e do neto Imperador Pedro II. Ali nasceu D. Maria II, Rainha de Portugal. Em 1892, pouco mais de dois anos depois do golpe militar que implantou a República, passou a hospedar o museu. Em meio a um bonito parque e vizinho do Jardim Zoológico do Rio.
Riquíssimo em antropologia, paleontologia, zoologia e botânica, teve seu acervo de 20 milhões de peças – mais de um milhão em livros –, formado por doações recebidas pelo Imperador, inclusive preciosidades do Egito, país que visitou duas vezes. Uma peça salva foi o meteorito que caiu em 1794, na Bahia, e foi levado ao museu em 1988.
Há cerca de 20 anos, chegou a ter um projeto examinado pelo Banco Interamericano para o Desenvolvimento, levado pelo empresário Israel Klabin. E, recentemente, o banco oficial de fomento aprovou um financiamento de cerca de quatro milhões de euros para obras de proteção elétrica e hidráulica, que não chegou a ser usado.
Não houve vítimas fatais, assim como no incêndio que ocorreu no Museu de Arte Moderna, em 1988, com perdas de obras de valor como Picasso, Dali e outros. O Brasil, nas últimas décadas, sofreu alguns incêndios de graves consequências, como o ocorrido em um circo na cidade de Niterói, em frente ao Rio de Janeiro, com mais de 300 mortos, e no Edifício Joelma, em São Paulo, que, em 1974, deixou quase 200 mortos.
No caso dos museus, teatros e patrimônio da Igreja Católica, a única solução para preservar é a maior presença da sociedade. Precisa-se, portanto, de fundações geridas pelo setor privado, com parte custeada pelos governos.
O Brasil tem um grande acervo em permanente risco, como a parte histórica do Rio, São Luiz, Salvador, Ouro Preto e outras cidades ricas em igrejas. Impossível o poder público gerir com competência.
Como o país está em plena campanha eleitoral, tem havido certa exploração política, mas, na verdade, as falhas refletem a crise. Foi no Museu Histórico Nacional como poderia ter sido em qualquer outro ponto precioso e abandonado. No caso do museu, a UFRJ há muito deveria ter passado, efetivamente, a gestão para o Ministério da Cultura, apesar de abrigar cursos importantes na área.
Tocou muito a população, abalada com a tragédia,e o governo é claro, a presença do ministro da Cultura de Portugal, Luís Filipe de Castro Mendes, no Rio de Janeiro. Ele esteve reunido no Consulado Geral, acompanhado dos embaixadores Jorge Cabral e Jaime Leitão. O encontro reuniu personalidades do mundo cultural brasileiro, entre os quais o ex-embaixador do Brasil em Lisboa, Alberto da Costa e Silva.